segunda-feira, 12 de abril de 2010

Gotas de Longevidade VI

- Mas o que é que se está a passar consigo? – Notava-se agora uma certa preocupação. – O que está a acontecer com a mãe? Isso vai parar?
- Não sei. – Disse a mulher, que agora já não era tão velha como dantes, pelo menos fisicamente. – Mas eu estou a rejuvenescer a sério. E isso é óptimo! – Ela sorriu. A filha abraçou-a, mas estava preocupada.
- Vou levá-la hoje ao médico. – Disse. – Isso não é… alguma coisa está a funcionar mal consigo.
- Vamos amanhã. Eu hoje quero desfrutar da minha juventude.
- Mas mãe… – Ela olhou-a como se implorasse. – Isso foi o que me disse ontem.
- Depois de andar numa cadeira de rodas por tanto tempo e de ter uma má audição e visão, eu quero poder aproveitar os meus sentidos rejuvenescidos. – Ela pegou numa pequena mala antiga. – Não desactivas-te o meu cartão de crédito, pois não?
- Não. Mas a mãe tem que ir visitar um médico. Nós não sabemos qual será o efeito amanhã ou daqui a um mês.
Eu vou à cabeleireira tratar destes cabelos brancos. – Disse enquanto colocava um lenço em redor da cabeça. – Emprestas-me os teus óculos de sol? – A rapariga ficou boquiaberta a olhar para a mãe.
- Mãe…por favor!
- Deduzo que isso seja um sim. – Saiu e não disse uma única palavra. Quando saiu pela porta da rua, respirou o ar fresco da manhã. Era tão inacreditável estar com a aparência de uma mulher de cinquenta anos, que tudo o resto não passavam de pormenores. Meteu a mão na mala, enquanto caminhava lentamente e tirou o frasquinho das gotas milagrosas. Sentiu um poder, que nunca antes tinha sentido. Ela sentia-se capaz de fazer de tudo, agora que estava a vencer o desgaste do tempo. Foi até a uma zona turística da cidade e alugou uma bicicleta.
Era verdade o que diziam. É uma coisa que nunca mais se esquece. Ia pedalando levemente, sentido o vento no rosto e acariciando-lhe o pescoço. Há anos que não se sentia assim. Nova e cheia de energia. E uma lista de coisas que queria fazer, coisas que não se lembrou de fazer enquanto teve tempo.
Enfiou pelo parque e parou junto ao lago. Encostou a bicicleta ao banco, tirou os óculos de sol e sentou-se um pouco a descansar. Os patos nadavam e mergulhavam animadamente. Algumas crianças ao longe deitavam-lhes pedaços de pão. Era uma manhã maravilhosa, até que sentiu um calafrio.
Um homem, vestido com um fato preto, estava sentado do lado oposto ao dela do lago. Observava-a. O cabelo cinzento, penteado para o lado, num rosto esquelético e enrugado. Parecia de uma pessoa nova mas com a pele de alguém muito velho. O corpo magro estava recostado para trás, com as pernas cruzadas num quatro perfeito. Os braços esticados ao longo do encosto do banco. Quando ela encontrou o seu olhar, ele sorriu, formando uma fina linha nos seus lábios. Parecia meio zombeteiro. Ela levantou-se do banco, colocou os óculos de sol e subiu para a bicicleta. Ela queria estar bem longe daquele homem. Ele era-lhe familiar de alguma maneira, mas não sabia de onde. Pedalou rápido, mais à frente abrandou e olhou para trás. Para se certificar que não estava a ser seguida. Respirou de alívio. O homem ficara no parque.

Sem comentários:

Enviar um comentário