sábado, 17 de abril de 2010

Gotas de Longevidade VII

Depois de ter ido à cabeleireira e ao shoping. Voltou para casa. A filha estava preocupada, sozinha em casa.
- Mãe! – Ela levantou-se e aproximou-se da mulher. – Onde é que esteve este tempo todo?
- Fui dar um passeio e tratar do meu cabelo. Gostas do meu novo corte de cabelo? – Ela devolveu-lhe os óculos de sol. – E obrigada pelo empréstimo. Comprei uns para mim. – Mostrou uns óculos de sol caros que comprara.
- Sim, gosto. Está tudo muito bem. Mas a mãe devia ter em consideração que eu estive este tempo todo preocupada consigo. Eu não sei qual a sua condição de saúde e você andou por ai, às compras, sozinha. E se a mãe se tivesse posto mal?
- Mas como? – Ela sorriu. – Eu estou-me a sentir com muita saúde. – Ela foi até à cozinha buscar um copo de água. – Temos que pensar noutra coisa. Não me pode chamar de mãe com este aspecto. Parece que nem dez anos temos de diferença. O que vão pensar as pessoas? – A filha respirou fundo.
- Muito bem. Posso tratá-la por Lucy então?
- Parece-me muito bem, querida. – Ela aproximou-se da filha e deu-lhe um beijo na testa. – Não tenhas medo por mim. Eu estou bem, a sério. – A filha sorriu, mas a sua expressão demonstrava medo. – Fica feliz por eu estar assim e não presa no andar de cima com a minha cadeira de rodas.
- Eu fico feliz se a mãe estiver feliz. – Disse abraçando a mãe. – Mas eu preocupo-me com a sua saúde, com o seu bem-estar. E temo que todo esse rejuvenescimento possa vir a tornar-se um problema.
- Oh minha querida. – Disse Lucy apertando a filha nos braços.
- Tem a certeza que foi só por causa daquela água que a mãe rejuvenesceu?
- Tenho. Foi a única coisa que tomei a mais que nos outros dias.
Ela estava feliz pela mãe. Mas não menos preocupada que antes. Não a conseguiu levar ao médico. Por isso decidiu procurar pela Elisabete Andrade.
Lucy ajudou os netos nos trabalhos de casa e foi com eles até ao parque nesse dia. Mas à noite, ela teve medo de se deitar. Uma questão passou-lhe pela mente. E se eu continuar a rejuvenescer até à minha inexistência? Sentiu um pouco de ansiedade. Deslocou-se até ao espelho e mirou-se.
- Se continuar a rejuvenescer, pelo menos morro jovem e bonita. – Disse em voz alta. Para si mesma. E foi-se deitar.
No outro dia de manhã, estranhou umas cócegas que sentiu nos cotovelos. Levantou-se muito agilmente. Sentiu longos cabelos e correu para a frente do espelho. Uma explosão de alegria brotou nela. Riu histericamente no quarto. A filha veio a correr, abriu a porta. E uma onda de horror e choque percorreu o seu rosto.
- Mas…O que? – O marido dela apareceu ao lado. Ainda em pijama.
- Oh meu Deus! – Ele também parecia aterrorizado e chocado. Lucy apenas continuava a rir.
- O meu sonho realizou-se! – Ria e, agora também, chorava de felicidade. – Voltei a ter a aparência de alguém com vinte anos. – Ela rodou em frente ao espelho, sorridente. A filha sentiu-se cair e desmaiou, amparada a tempo pelo marido, antes de cair no chão.
Lucy penteou o cabelo liso e castanho claro, comprido. Ela conseguia ver de novo os seus grandes e vivos olhos cor de avelã. Nesse dia concordou ir com a filha ao médico. Não que quisesse, mas porque a filha estava mesmo preocupada e numa pilha de nervos.
- Estás pronta para ir Lucy? – Disse o homem, agora vestido com roupa do dia-a-dia.
- Sabe Carlos, nunca lhe disse isto. Mas eu queria agradecer por ter sido um genro tão bom para mim todos estes anos. – Disse Lucy, no seu tom jovial típico de uma rapariga de vinte anos. – É muito paciente e um excelente marido e pai. É uma dávida de Deus. – O homem sorriu, mas dava para notar um olhar triste nos seus olhos escuros.
- Obrigada Lucy. Mas você sempre foi uma boa sogra, eu só tinha que retribuir aquilo que você foi para mim. – Ela sorriu, percebendo a tristeza dele.
- Não esteja preocupado comigo. A minha filha também se preocupa de mais. – Ela pegou numa bolsinha que tinha comprado no dia anterior. – Vamos?

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Gotas de Longevidade VI

- Mas o que é que se está a passar consigo? – Notava-se agora uma certa preocupação. – O que está a acontecer com a mãe? Isso vai parar?
- Não sei. – Disse a mulher, que agora já não era tão velha como dantes, pelo menos fisicamente. – Mas eu estou a rejuvenescer a sério. E isso é óptimo! – Ela sorriu. A filha abraçou-a, mas estava preocupada.
- Vou levá-la hoje ao médico. – Disse. – Isso não é… alguma coisa está a funcionar mal consigo.
- Vamos amanhã. Eu hoje quero desfrutar da minha juventude.
- Mas mãe… – Ela olhou-a como se implorasse. – Isso foi o que me disse ontem.
- Depois de andar numa cadeira de rodas por tanto tempo e de ter uma má audição e visão, eu quero poder aproveitar os meus sentidos rejuvenescidos. – Ela pegou numa pequena mala antiga. – Não desactivas-te o meu cartão de crédito, pois não?
- Não. Mas a mãe tem que ir visitar um médico. Nós não sabemos qual será o efeito amanhã ou daqui a um mês.
Eu vou à cabeleireira tratar destes cabelos brancos. – Disse enquanto colocava um lenço em redor da cabeça. – Emprestas-me os teus óculos de sol? – A rapariga ficou boquiaberta a olhar para a mãe.
- Mãe…por favor!
- Deduzo que isso seja um sim. – Saiu e não disse uma única palavra. Quando saiu pela porta da rua, respirou o ar fresco da manhã. Era tão inacreditável estar com a aparência de uma mulher de cinquenta anos, que tudo o resto não passavam de pormenores. Meteu a mão na mala, enquanto caminhava lentamente e tirou o frasquinho das gotas milagrosas. Sentiu um poder, que nunca antes tinha sentido. Ela sentia-se capaz de fazer de tudo, agora que estava a vencer o desgaste do tempo. Foi até a uma zona turística da cidade e alugou uma bicicleta.
Era verdade o que diziam. É uma coisa que nunca mais se esquece. Ia pedalando levemente, sentido o vento no rosto e acariciando-lhe o pescoço. Há anos que não se sentia assim. Nova e cheia de energia. E uma lista de coisas que queria fazer, coisas que não se lembrou de fazer enquanto teve tempo.
Enfiou pelo parque e parou junto ao lago. Encostou a bicicleta ao banco, tirou os óculos de sol e sentou-se um pouco a descansar. Os patos nadavam e mergulhavam animadamente. Algumas crianças ao longe deitavam-lhes pedaços de pão. Era uma manhã maravilhosa, até que sentiu um calafrio.
Um homem, vestido com um fato preto, estava sentado do lado oposto ao dela do lago. Observava-a. O cabelo cinzento, penteado para o lado, num rosto esquelético e enrugado. Parecia de uma pessoa nova mas com a pele de alguém muito velho. O corpo magro estava recostado para trás, com as pernas cruzadas num quatro perfeito. Os braços esticados ao longo do encosto do banco. Quando ela encontrou o seu olhar, ele sorriu, formando uma fina linha nos seus lábios. Parecia meio zombeteiro. Ela levantou-se do banco, colocou os óculos de sol e subiu para a bicicleta. Ela queria estar bem longe daquele homem. Ele era-lhe familiar de alguma maneira, mas não sabia de onde. Pedalou rápido, mais à frente abrandou e olhou para trás. Para se certificar que não estava a ser seguida. Respirou de alívio. O homem ficara no parque.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Gotas de Logevidade V

Desceu as escadas ainda com dificuldade, mas pelo seu próprio pé. Uma felicidade cega preencheu toda a sua alma. Foi o mais depressa que conseguiu até à cozinha, para mostrar à família.
- Ahhh! – Gritou Cristina. – A MÃE ESTÁ A ANDAR SOZINHA! – Ela chorou e abraçou a velhinha. – É UM MILAGRE!!! – O homem apareceu no topo das escadas.
- Mas para que estás a gri… – Ficou a olhar embasbacado para a velha. – Mas o que é que fez? – O rosto iluminou-se em felicidade. – Você parece óptima. – E foi abraçar a velhinha.
- Foi a água benta milagrosa. – Disse a velhinha chorando de felicidade. Numa voz que se pronunciava com menos dificuldade e mais agilmente. – Eu disse que ela me ia fazer sentir melhor.
- Meninos venham ver uma coisa cá abaixo. – Chamou Cristina. Os dois netos apareceram no cimo das escadas, surpresos. E começaram a correr em direcção á avó.
- Resultou! – Gritou a menina. – O que a Elisabete disse era verdade! – O rapaz estava a lado dela a olhar maravilhado para a avó. Ela abraçou os netos com força.
- Temos que visitar o seu médico! – Cristina disse entusiasmada. – O que vai ele dizer quando vir isto. – Ela estava frenética. – Depois de nos ter dito que a mãe não ia voltar a andar.
- Hoje não! – Disse a senhora fazendo uma lista mental de todas as coisas que queria fazer. – Tenho muito que aproveitar. – A filha não ficou satisfeita, embora estivesse feliz pela mãe. Uma preocupação paralela apoderou-se dela
Foi um momento como já há muito tempo não tinham em família. Nesse dia todos saíram num passeio, almoçaram e jantaram fora. Foram ao cinema, passaram pelo centro comercial e ainda tiveram tempo de levar a senhora a visitar algumas amigas. Que para seu espanto, algumas tinham falecido, outras estavam internadas… todas tinham o peso da idade. Por isso desistiu de as visitar, para que elas não se sentissem mais mal.
Mas independentemente disso, ela quis aproveitar o tempo com a família, sobretudo com os netos. A velhinha não se lembrava de quando foi a ultima vez que se divertiu tanto. Fartou-se de contar histórias aos netos, de brincar com eles. A filha falou com ela sobre algumas mudanças que tinham ocorrido na vida profissional dela, que nem se tinha apercebido. O homem contou alguns planos que tinham para se mudar para uma casa mais perto dos empregos dele e da mulher.
À noite a velhinha não tomou mais nenhuma gota. Lembrando-se do conselho de que não devia tomar mais de uma gota por mês. Só no último dia tinha tomado umas dez. Um arrepio percorreu-lhe a espinha. Mas ignorou, ficou a olhar para o seu reflexo levemente rejuvenescido por um bocado e foi-se deitar com um sorriso nos lábios.
No outro dia de manhã, ela sentia-se bem. Tinha repousado muito bem durante a noite, não tinha qualquer tipo de dores. Abriu os olhos e levantou-se da cama. Quando foi olhar-se ao espelho teve o choque da sua vida. Ela olhava para o reflexo de uma mulher que aparentava ter cinquenta anos. Era ela com cinquenta anos. As rugas mais disfarçadas. Os olhos castanhos avelã. Um perfil magro e elegante. Tudo exactamente como ela se lembrava na altura, excepto algumas mechas de cabelo branco misturado com cabelo castanho claro. Ela correu para a mesa-de-cabeceira. Era cedo, provavelmente ainda ninguém se tinha levantado. Ela estava muito feliz, mas não sabia como contar a novidade à família. Eles não iam acreditar que era ela. Ou talvez até fossem, afinal a filha dela devia lembrar-se do aspecto da mãe há uns anos atrás.
Não sabia se havia de estar entusiasmada ou com medo. Estas mudanças de contranatura agitavam parte das suas crenças religiosas. O padre Marcelino não iria ver aquilo com bons olhos. Possivelmente chamar-lhe-ia de demónio ou assim. Mas o pior era uma questão que pairava sobre si. Quando é que o processo de rejuvenescimento iria parar?
Quando ouviu a primeira pancada na porta perguntou quem era. Era a filha, por isso pediu para que entrasse no quarto e que se mantivesse calma. A filha assim o fez, nervosamente. Quando encarou a mãe, a sua expressão transformou-se num misto de choque e felicidade.