segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Toque da noite: XII


Levantou-se cedo. As poucas horas de sono eram incapazes de superar a ansiedade que sentia em relação aquele dia. Ele sentia-se como se fosse mexer com o lado emocional de Tatiana em vão. Maria tinha necessidade de contar a Tatiana toda aquela história, mas ele não via necessidade disso. Até porque não acreditava que os sonhos de Maria eram de facto premonitórios. Ele lembrou-se do desespero que viu naqueles olhos verdes, na noite passada e sentiu-se incapaz de negar isso a Maria. Tatiana podia vir a sofrer com aquela ideia disparatada, mas acabaria por compreender que Maria precisava de ajuda, e eventualmente acabava por lhes perdoar.

A mãe dele tinha ido trabalhar, o que era bom. Ele tomou o pequeno-almoço e foi directo a casa de Maria. Quando lá chegou, ela estava na varanda do seu quarto. Correu para descer e escapuliu-se pela porta, dando um bom-dia ao amigo.
- Vamos ter com a Tatiana. – Disse ela apressando o passo em direcção ao caminho. Daniel notou nas grandes olheiras arroxeadas que se tinham formado por baixo dos olhos de Maria, mesmo estando disfarçadas com um pouco de maquilhagem.
- Tem calma. Ainda nem pensámos em como lhe vamos dizer. – Daniel quase que correu para chegar junto dela e poder acompanhar o passo.
- Eu tive muito tempo para pensar nisso hoje de madrugada.
- Tens cara disso. Quantas horas dormiste?
- Não sei. Poucas. – Maria caminhava desenfreadamente. Daniel tentou acompanhá-la.
- Sabes ao menos se ela já está acordada?
- Sei. Eu telefonei-lhe hoje de manhã, para contar que já tinha voltado á aldeia. E disse-lhe que tinha um assunto urgentíssimo para falar com ela. – Maria abrandou o passo quando saiu no portão. – Disse-lhe para ir ter connosco junto à ponte. E eu também te mandei uma sms, era escusado ires lá a casa indo-nos encontrar perto da tua casa.
- Eu ainda não liguei o telemóvel hoje. Não vi a sms. – Daniel meteu a mão no bolso e ligou o telemóvel. – Cá está. – Maria parecia ansiosa. Especialmente quando a sua vista alcançava a ponte e viu Tatiana sentada no muro. Maria olhou para Daniel.
- Ok. Vamos a isto.
- Vamos. – Forçou Daniel, como que um incentivo. Tatiana tirava bocadinhos de musgo seco do muro, atirando-os para a ribeira.
- Oh. Olá! – Tatiana pôs-se de pé. – Não sabia que tu também vinhas. – Disse a Daniel.
- Porque não haveria de vir? É um assunto urgentíssimo. – Ele deu-lhe de resposta.
- É. Mas tu já sabes o que é? – Tatiana perguntou, mas ele desviou-se da pergunta.
- Vamos sentar-nos naquela rocha. – Os três foram para lá. Tatiana foi a única que se sentou, Daniel ficou ao lado de Maria, de pé em frente de Tatiana.
- Ok. Contem lá o que se passa. – Tatiana tinha as pernas cruzadas e parecia um pouco aborrecida. – Já estou a ver que o Daniel soube antes de mim, desse assunto urgente.
- É um assunto sério. – Maria começou seriamente. – E por favor ouve-me até ao fim antes de dizeres o que quer que seja. – Tatiana descruzou as pernas, e inclinou-se ligeiramente para a frente.
- Estás-me a assustar. – Tatiana olhou de Maria para Daniel e de volta para a Maria. Maria respirou fundo. Daniel colocou-lhe uma mão no ombro. Então, encorajada pela presença do amigo, ela contou tudo sobre os seus sonhos, excepto do último, em que tinha sonhado com o desaparecimento de um dos gémeos.
Tatiana alternava entre o choque e pena que tinha de Maria. Ao ouvir parte do que Maria tinha contando sobre os sonhos, ela ficou calada, como a tentar absorver tudo o que lhe foi contado.
- Desaparecem misteriosamente? O vulto negro mostra-te porquê e como em sonhos?
- Uma pergunta de cada vez. – Daniel pediu. Tatiana olhava para Maria, com uma expressão preocupada.
- Oh Maria! – Ela levantou-se e abraçou a amiga. – Como é que aguentaste todo este tempo com esse segredo?
- Com paciência. – Maria disse, enquanto algumas lágrimas lhe caíam, juntando-se às de Tatiana.
- Eu se estivesse no teu lugar tinha dado em maluca. Só de pensar em vultos negros à noite fico com pele de galinha. – Tatiana apontou para o seu braço, com os pelos eriçados. – E o teu avô…. – Maria limpou as lágrimas com a mão. Tatiana também limpou as suas. – Como é que tu acreditas nisto? – Disse a Daniel. – Estás sempre cheio de cepticismos e de respostas científicas.
- É complicado demais para eu explicar agora. – Daniel respondeu, sem querer dar sinal de que não acreditava em frente de Maria.
- Mas ainda há mais. – Tatiana virou-se para Maria, Daniel sentou-se na rocha.
- Consegues ver outras coisas para além das pessoas que vão desaparecer? – Tatiana parecia animada com a ideia.
- Não. – Maria sentou-se ao lado de Daniel.
- Ela teve outro sonho recentemente. Com alguém que todos conhecemos. – Tatiana congelou ao ouvir as palavras de Daniel.
- Quem? – Foi a única coisa que conseguiu perguntar.
- O Alexandre, um dos gémeos. – Os suaves contornos da face de Tatiana enrugaram-se, numa expressão carregada e grosseira. Os olhos encheram-se de lágrimas e um misto de tristeza e horror passavam pela sua expressão. Daniel levantou-se para a segurar, não fosse ela fraquejar e cair no chão. Maria ficou à espera de ouvir um grito ou qualquer coisa do tipo. Mas não saiu nada. As lágrimas caiam em cascata nos olhos de Tatiana, mas não se ouvia um soluço nem um gemido. Maria temeu o pior e ajudou Daniel a sentar a amiga na rocha. Ela parecia paralisada de alguma maneira, os olhos distantes. Maria deu-lhe umas leves palmadas na cara.
- Tatiana…responde. – Maria deu-lhe palmadinhas e foi aumentando a força. Daniel foi até à ribeira e com a mão em concha pegou num pouco de água, que atirou para a cara de Tatiana. Ela estremeceu e olhou para Maria.
- Quando?
- Não sei dizer ao certo, mas vai ser esta semana de certeza. – Tatiana levantou-se da rocha.
- Ai meu Deus! O que vamos fazer? – Ela meteu as mãos na cabeça. As lágrimas continuavam a percorrer-lhe a face e desta vez eram bem audíveis os soluços.
- Tatiana tens que te acalmar. Nesse estado não vais conseguir pensar correctamente. Não vais poder ajudar o teu primo se te puseres assim cada vez que o vês ou pensas nele. – Daniel pegou nos ombros dela. Ela tentou libertar-se. – Acalma-te! Pelo bem da tua saúde e da sobrevivência do teu primo. – Ele agitou-a um pouco. Ela acalmou e ele abraçou-a. – Vamos pensar numa solução. – Daniel disse calmamente. Maria olhava para os amigos, para a esperança que ambos tinham, mas quase com toda a certeza que nada iam poder fazer em relação ao gémeo.
- O que vamos fazer? – Tatiana perguntou, agora mais calma, mas ainda um pouco ansiosa.
- Os desaparecimentos ocorrem de noite. Portanto vais ter que ficar a noite toda ao lado do Alexandre. – Disse Daniel.
- Eu posso fazer isso. Mas e depois? Se aquela coisa aparecer? – Maria olhou para Daniel.
- Não é uma coisa. Deve ser um homem, pelo que a Maria descreveu. Nada que não se possa controlar. Gritas por ajuda. – Maria parecia chocada com aquilo. – Não vais sair de casa à noite pois não? – Tatiana abanou a cabeça.
- Agora que sei isto, não.
- Eu não sei se aquilo é um homem. – Maria disse para Daniel. – Eu só vi um vulto e ouvi a sua voz. Pode ser uma outra coisa qualquer.
- Um extraterrestre? – Tatiana perguntou. Daniel rolou os olhos, sem se aperceber.
- Sei lá. Eu sei tanto quanto vocês nesse aspecto.
- Ou seja, nada. – Concluiu Tatiana. Maria baixou a cabeça. – Qual foi a rapariga que disse que não podia curar esse tipo de problemas, quando foste procurar curandeiras e bruxas na cidade?
- É uma rapariga que diz que descobriu os seus poderes há pouco tempo. Ela diz que é médium…
- Temos que lá ir. – Tatiana interrompeu. - Hoje não vamos conseguir ir. O autocarro já foi para a cidade. Amanhã vamos. Se precisarem de uma desculpa digam aos vossos pais e avó que me vão fazer companhia, que eu preciso de sair para me distrair. Eu falo com a minha mãe e ela não arranja problemas por causa disso. – Tatiana pausou e olhou para os amigos. – Isto se quiserem vir.
- Eu vou de certeza. – Maria disse.
- Yah. Eu também vou. – Que alternativa lhe restava. Pensou Daniel.
Foi complicado para Maria explicar aos pais o porque daquela súbita visita à cidade com os amigos. Mas com o apoio da avó, após apelar ao lado sentimental dela, com uma história sobre o facto de os gémeos precisarem de se distrair e de Tatiana precisar de ajuda para comprar um jogo/brinquedo que os entretece e animasse um pouco. Acabou por conseguir a permissão para ir lá.



2 comentários:

  1. Saudações!

    Tudo bem?

    Vim agradecer a vista ao blog CRIATURAS DA ESCURIDÃO e também aos elogios.

    Só não entendi o porque você não conseguiu tornar-se seguidora do blog... Tem como sim, caso você queira tentar novamente, ok?

    Obrigado!

    Kampos

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  2. Nemsei mais o que dizer, esta escrevendo muito, mas muito bem´!É impressionante!
    Estare ancioando as continuações...Sinto turbulencia vindo porae...Ai q vontade de saber os próximos caps. *.............*
    bjkz
    ╬♥╬

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