À noite, quando se deitou, voltou a sentir ansiedade. Aquela velha sensação que é capaz de deitar qualquer um a baixo. Levantou-se e ficou a deslumbrar o seu reflexo no espelho. Rezou, com toda a fé que possuía, para que no dia seguinte não sofresse mais nenhum rejuvenescimento. Pensou em não dormir, mas o cansaço falou mais alto.
Cristina levantou-se cedo para visitar Elisabete, na morada que lhe indicaram. Bateu à porta de uma grande casa, enriquecida por um grande jardim com uma escultura do que parecia ser uma rocha que libertava uma mini cascata de água.
- Bom dia. – Disse uma mulher, na casa dos trinta, com feições um tanto masculinas e de nariz afiado. O cabelo enrolado num rabo-de-cavalo frisado. – Nós não estamos interessados em comprar nada.
- Bom-dia! Eu não sou uma vendedora. Eu estou aqui por causa de um frasco com água benta milagrosa. – A mulher pareceu não compreender.
- Desculpe?
- O nome Lúcia Rebelo diz-lhe alguma coisa? – A mulher abriu a boca de espanto.
- Lucy? És tu?
- Não. Eu sou a filha. Cristina. – A mulher desviou-se da porta, um tanto atrapalhada.
- Oh. Entre, entre.
- Obrigada. – Cristina entrou. A casa esta ricamente decorada. Sentaram-se as duas num grande sofá de pele creme. – A minha mãe tomou as gotas do frasco que a senhora lhe enviou. Ela tem rejuvenescido da noite para o dia. Principalmente nestes últimos três dias. Já passou por aparências desde os setenta, cinquenta e agora parece uma rapariga de vinte anos. – A mulher abriu os olhos de espanto, e levou as mãos à boca.
- Não, não, não. – Ela chegou-se mais perto de Cristina. – Eu escrevi explicitamente que não devia tomar mais de uma gota por mês.
- Eu não sei se ela tomou mais de uma …
- Era a única maneira de passar pelo processo de rejuvenescimento tão depressa! – Ela continuava aflita.
- Qual é a consequência?
- Uma gota representa um ano, se ela tomou mais de dez gotas num mês, vai morrer. Ela vai desfazer-se até à última célula. Imagine o processo em que é criado o bebé. Todo o desenvolvimento do feto no ventre materno, desde a primeira célula. Ela vai passar por isso, mas de forma revertida e muito mais acelerada. No máximo de uma meia hora à noite.
- Oh meu Deus. – Cristina chorou. – Há forma de evitar isso?
- Não que seja do meu conhecimento. – A mulher baixou o olhar e apertou as mãos, ansiosa. – Disse que hoje parecia uma rapariga de vinte anos?
- Não, isso foi ontem. – Cristina levantou-se.
- Já a viu hoje? – Cristina abanou a cabeça. E saiu disparada da casa. Guiou com excesso de velocidade e passou alguns sinais vermelhos. Estacionou em cima da relva na entrada da sua casa e correu pelas escadas acima, até ao quarto de Lucy. Abriu a porta de rompante e percorreu o quarto com os olhos. Estava vazio. Os lençóis da cama estavam enrugados, puxados para cima até á almofada. Cristina puxou o lençol para baixo. A cama estava vazia, há excepção de um anel que estava quase debaixo da almofada. Era um anel de ouro, com um diamante. Era o anel que o pai de Cristina deu a Lucy, depois de saber que tinha um problema grave de coração, para que ela se lembrasse que o amor deles era para sempre. Lucy nunca o tinha tirado desde o dia em que o marido lho colocou no dedo.
Cristina pegou no anel, sentou-se na cama e chorou a perda da mãe.
Fim