sexta-feira, 19 de março de 2010

Gotas de Longevidade IV

hÀ noite, quando a senhora estava deitada na cama. Pediu à rapariga para lhe deitar uma gota da água rejuvenescedora no copo. Ela observou atentamente.
- Mãe, posso lhe perguntar para que serve esta água benta milagrosa? – A rapariga agitou a água com a colher de maneira a que a gota ficasse bem diluída.
- Oh filha. Ela é mesmo isso, milagrosa. Vai-me fazer sentir melhor. – E sorriu, iluminando todo o seu rosto. Ela parecia tão feliz que assustou a filha. A mulher olhou para ela com preocupação.
- Mãe, eu não a vou deixar beber isto. – E começou a ir em direcção à porta, com o copo de água numa mão e o conta-gotas noutra.
- Porque não? – Disse a senhora já com alguma aflição.
- Diga-me exactamente o que este frasco contém! – A mulher ficou junto à porta olhando para a mãe, com uma expressão rígida.
- Eu juro-te pela saúde do que me é mais querido que isso é apenas água benta! – A senhora estava agora a ficar nervosa.
- Então isso quer dizer que nada de mal me acontecerá se eu beber este copo de água. – A mulher estava desafiadora.
- Não acontecerá nada. Talvez te sintas um pouco mais bem disposta e com a alma mais leve. – Disse em tom brincalhão. – Filha! – A senhora acalmou-se e tentou falar serenamente, numa tentativa de transmitir segurança. – Se achas que eu ia beber algum veneno ou assim, é porque não me conheces bem.
A mulher aproximou-se dela e sentou-se à beira da cama, com os olhos húmidos.
- Mãe, eu temo por si. Eu gosto muito de si e esforço-me para lhe dar o maior conforto possível. Mas ultimamente parece que isso não tem sido o suficiente. – Lágrimas começaram, a escorrer-lhe pelo rosto. – Eu sei que a mãe tem cada vez mais dores e que lhe custa mover-se.
- Minha querida! – A senhora disse emocionada, limpando-lhe as lágrimas. – Mas tu já me dás tudo. – Pegou na mão da filha para a beijar. – Como é que eu poderia por fim à minha vida, amando-vos como amo?
- Eu não sei mãe. As pessoas quando sentem dores são capazes das coisas mais disparatadas…
- Cristina Sofia! Tu estás-me a querer dizer que tens medo que eu seja como a tonta da Cremilde Sousa, que se tentou suicidar porque não aguentava as dores na coluna? – Cristina corou e envergonhadamente acenou com a cabeça.
- Mais ou menos…
- Então força! Bebe esse copo de água e comprova que o que te estou a dizer é verdade. Isso é apenas água benzida pelo Papa. – Cristina pegou no copo e levou aos lábios, bebendo toda a água no seu interior. A senhora não moveu nem um dedo para impedir que a filha bebesse tudo. – Então? Soube-te bem?
- Ainda não sei, se fosse veneno podia levar algum tempo a surtir efeito! – Disse divertida. A senhora riu.
- Vá, põe lá isso num copo para mim… – E olhou-a séria. – Mas só uma gota, não mais.
- Tem a certeza que isto serve para “pôr a alma mais leve”. – Disse, com ênfase em “alma mais leve”, enquanto agitava a água com a colher.
- É o que vou descobrir. – Respondeu a senhora enquanto pegava no copo. Bebendo aos golinhos a água.
Nessa noite dormiu profundamente, mas nada aconteceu. No outro dia de manhã, parecia estar na mesma. A senhora ficou desesperada. Cristina confiou na mãe para lhe deixar o conta-gotas em cima da mesinha de cabeceira ao lado de uma garrafa de água. E nessa noite, voltou a colocar outra gota num copo de água, bebeu e dormiu. Fez isso durante a semana toda. Mas nada pareceu mudar. Continuava velha e enrugada. O que antes era desespero, tornou-se numa agonia, num sentimento de que fora traída pela esperança de algo aparentemente impossível. Nessa outra noite colocou mais de uma gota, acabando por colocar duas gotas de água rejuvenescedora no copo. Dormiu mais pesadamente que nos outros dias.
No outro dia de manhã, ela sentiu menos esforço para se sentar na cama. As pernas não lhe pesavam e as suas mãos pareciam menos enrugadas. Uma onda de felicidade preencheu-a. Tentou levantar-se da cama sem ajuda e conseguiu. Foi em direcção ao espelho e quase que desmaiou ao olhar para o seu reflexo. Parecia que tinha voltado aos setenta anos. Embora estivesse ainda enrugada, os olhos não eram tão claros, haviam mais vestígios dos seus olhos castanhos avelã.



2 comentários:

  1. NOssa!Ela vai ficar jovem de novo!Incrível!
    Adorei a maneira com que colocou a visão da filha...As vezes olhamos as pessoas e achamos que ela irão mesmo se matarXD
    Você transmite os sentimentos de forma muito hamoniosa!Continue assim
    bjs

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  2. Obrigada pelos seus comentários!
    XD

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